domingo, 11 de março de 2012

A Quaresma como combate espiritual


Por Dom Henrique Soares da Costa

Simone Martini, A compaixão da Virgem Maria, Séc XIV

1. “Exorto-vos, irmãos, pela misericórdia de Deus, a que ofereçais vossos corpos como hóstia viva, santa e agradável a Deus: este é o vosso culto espiritual. E não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos, renovando a vossa mente, a fim de poderdes discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, agradável e perfeito” (Rm 12, 1s).

“... em Jesus fostes ensinados a remover o vosso modo de vida anterior – o homem velho, que se corrompe ao sabor das concupiscências enganosas – e a renovar-vos pela transformação espiritual da vossa mente, e revestir-vos do Homem Novo, criado segundo Deus, na justiça e santidade da verdade” (Ef 4,21-24).
A Quaresma tem um sentido eminentemente pascal: é um tempo de caminho de conversão a Cristo, período de cristificação. “Morremos com o Cristo; trazemos em nosso corpo a morte de Cristo, para que também a vida de Cristo se manifeste em nós. Já não vivemos, portanto, nossa própria vida, mas a vida de Cristo, vida de inocência, vida de castidade, vida de sinceridade e de todas as virtudes. Ressuscitamos com o Cristo; vivamos, pois, com ele, subamos com ele, a fim de que a serpente não possa encontrar na terra nosso calcanhar”. (Sto. Ambrósio, Tratado sobre a Fuga do Mundo)

2. Esta cristificação é ação do Espírito Santo: o homem não pode atingir tal escopo sem a graça do Santo Espírito, único que pode testemunhar Jesus em nós e conformar-nos a Cristo. Por isso mesmo, a busca da cristificação é um combate espiritual: combate porque é luta contra as tendências desencontradas do homem velho, que ainda persistem em nós; espiritual porque é combate na força do Espírito do Cristo: “Por ele, os corações são elevados ao alto, os fracos são conduzidos pela mão, os que progridem na virtude chegam à perfeição. Ele ilumina os que foram purificados de toda a mancha e torna-os espirituais pela comunhão consigo... Dele nos vem a alegria sem fim, a união constante e a semelhança com Deus; dele procede, enfim o bem mais sublime que se pode desejar: o homem é divinizado” (S. Basílio Magno, Tratado sobre o Espírito Santo).

3. A Quaresma é, pois, tempo do combate espiritual, tempo de uma ascese mais cuidadosa, ascese de caráter cristo-pneumatológico, tendo como fim a divinização (a vida de filhos do Pai). Sendo assim, esse tempo nada mais é que uma intensificação daquilo que é e deve ser toda a vida do cristão. São Bento, por exemplo, dizia a seus monges que a vida deles deveria ser uma contínua quaresma (= uma contínua preparação para a Páscoa).

4. Alguns elementos da ascese quaresmal:
i. o jejum (a penitência física):
Ø como meio de tomar consciência da dependência de Deus,
Ø como meio de domar nossas paixões,
Ø como meio de atingir a educação de nossos instintos,
Ø como modo de nos sensibilizar-nos para a fome alheia.
ii. a oração:
Ø como modo de nos abrir para Deus e sua Presença,
Ø como meio de nos fazer sensíveis à sua Palavra,
Ø como modo de nos ajudar a compreender sua santa vontade,
Ø como meio de tudo avaliar com o coração de Deus,
Ø como modo privilegiado de fazer-se dócil à ação do Espírito.
iii. a esmola:
Ø abre-nos para os outros,
Ø é sinal da própria comunhão trinitária,
Ø é remédio contra nossas concupiscências,
Ø nos descentra.
iv. as vigílias:
Ø para nos ajudar a vigiar pela vinda do Reino,
Ø para nos ajudar no combate à preguiça espiritual,
Ø para nos fazer intercessores pelo mundo que dorme,
Ø para nos ajudar no autodomínio.
v. a gravidade (o silêncio, a mortificação da curiosidade e dos excessos):
Ø para nos concentrar no único necessário,
Ø para nos colocar na presença de Deus,
Ø para nos ajudar no amadurecimento espiritual.
5. Sugestões para leitura:
Liturgia das Horas: Sermão de S. Leão Magno (5a. feira depois das cinzas)
Liturgia das Horas: Discurso de S. Pedro Crisólogo (3a. feira da III semana da quaresma)
Lc 21,34-36

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